quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Liberdade às Imagens e Palavras – pintura de Luiz Morgadinho na Casa da Cultura de Seia

Luiz Morgadinho, “Reformados de Portugal”, 2011, acrílico s/tela. ©LM

Decorre até final de outubro, nas galerias da Casa da Cultura, a primeira exposição individual de Luiz Morgadinho em Seia. Intitulada “Liberdade às Imagens e Palavras”, a exposição reune 41 obras realizadas nos últimos anos, entre as quais duas séries de 7 pequenos quadros,“Tudo vê” e “Aldeia”, de 2013. Para além de uma linguagem plástica própria, deliberadamente fixada na área do “naïf”, o traço comum destas obras é o seu poder narrativo visual, irreverente e trocista, aliando uma estrutura comunicativa muito próxima do "cartoon" ao delírio imagético e culto do bizarro - hoje entendido como “surrealismo”.

Fundado há cerca de 90 anos em França por André Breton, o Surrealismo apresentava-se então como “Automatismo psíquico puro, pelo qual se pretende exprimir, quer verbalmente, quer pela escrita, ou por qualquer outra maneira, o funcionamento real do pensamento (…) na  ausência do controle  exercido pela razão, sem qualquer preocupação  estética ou moral”. As novas propostas de apreensão da realidade (1), a irreverência e liberdade criativa defendidas pelo movimento, em parte herdadas da revolução dadaísta, agrada sobretudo aos jovens artistas, o que ajudou à difusão internacional do movimento. No entanto, as obras estranhas dos surrealistas e a personalidade complexa dos principais ideólogos e artistas do movimento, transformaram o termo “surrealismo” em sinónimo de estranho, bizarro, absurdo. Em muitos países, os ideais ortodoxos do Surrealismo adaptaram-se às realidades locais e Portugal não foi exceção. Alguns artistas sobreviventes do Grupo  Surrealista de Lisboa, de Os Surrealistas e dos grupos do Café Gelo e do Café Royal, mantiveram aceso o culto do surrealismo original mas o surrealismo tem recebido, na última  década, um forte impulso renovador de artistas naturais e residentes na região centro. Com boas  relações com outros grupos surrealistas, sobretudo americanos e europeus, alguns destes artistas agruparam-se e viajam atualmente nas carruagens da frente do surrealismo internacional, expondo em diversos países da Europa e Américas ao lado dos seus congéneres locais.

Luiz Morgadinho é um desses artistas, um pintor de inspiração surrealista, ou, como ele próprio prefere dizer, um "operário plástico do naife e do bizarro". Em 2012, participou na exposição coletiva internacional “Surrealism in 2012”, realizada em Reading, EUA, com trabalhos individuais e obras coletivas executadas em parceria com elementos da Secção  surrealista do Mondego. Em 2013, participou na exposição coletiva itinerante “Somos todos criados pelo amor”, que levou obras surrealistas a  várias cidades da República Checa.

Natural de Coimbra (1964), Morgadinho reside em Santa Comba de Seia e dirige a Associação de Arte e Imagem de Seia. Em 2009, foi homenageado na ARTIS VIII - Festa das Artes e Ideias de Seia e recebeu em 2010 o Prémio Município de Oliveira do Hospital no âmbito do AGIRARTE 13, pela obra "No País dos Lambe Botas”. Este  título ilustra adequadamente o posicionamento crítico do artista relativamente ao seu tempo, como salienta Miguel de Carvalho: “Morgadinho é um desses arcanjos, um poeta da imagem que se aproxima subtilmente da crítica social e política, questionando a pertinência e a capacidade simbólica da vida tradicional, desfigurando profundamente os seus clichés e as suas convenções” (2).

Depois da exposição individual de pintura em Oliveira do Hospital, “Ontogénese do Quotidiano” e da exposição individual itinerante “Ad Instar… à semelhança de…”, que esteve patente em Trancoso e na Guarda, Luiz Morgadinho realiza finalmente uma grande exposição individual em Seia.


Notas:
(1)-Mais do que um movimento artístico, o surrealismo é uma maneira de ver, sentir e pensar o mundo. A experiência surrealista privilegia a imaginação, tentando por diversos meios superar a contradição entre objetividade e subjetividade, conciliar sonho e realidade numa sobre-realidade, a “surrealidade” (“surrealité”). Ou, nas palavras de Mário Cesariny, evocando o Primeiro Manifesto: "E para a idéia da Totalidade duma Vida Única nós acreditamos na conjugação futura desses dois estados, na aparência tão contraditórios, que são o Sonho e a Realidade. Acreditamos numa Realidade Absoluta, numa SURREALIDADE, se é lícito dizer-se assim." (“A Afixação Proibida”, Mario Cesariny de Vasconcelos)
(2)-Miguel de Carvalho, texto de apresentação da exposição.

Luiz Morgadinho, “Tudo vê – I”, 2013, acrílico s/cartão telado. ©LM

Luiz Morgadinho, “Civilização”, 2012, acrílico s/tela. ©LM

Luiz Morgadinho, “Olhando o futuro”, 2012, acrílico s/tela. ©LM

Sem comentários: