domingo, 16 de julho de 2017

Abertura da 2ª Bienal de Gaia excedeu as expetativas

No dia 08 de julho, foi inaugurada a 2ª Bienal Internacional de Arte de Gaia. Uma Bienal de Causas, com um conjunto espantoso de exposições em cerca de 6000 m2, qualidade, variedade,... As Artes nacionais com excelente representação. Na conversa com Graça Morais falou-se obviamente da sua obra e contributo fundamental para a Arte Portuguesa Contemporânea, mas também foram abordadas algumas problemáticas da arte e dos artistas no Portugal atual.

Participo com pintura na exposição de Artistas Convidados (Gaia), no Pólo de Cerveira (integrado na XIX Bienal de Arte de Cerveira) e no Pólo de Seia.

2ª Bienal Internacional de Gaia, no Centro Empresarial Fercopor (antiga Coats & Clark) com entrada pela avenida Vasco da Gama, 774, a 800 metros da estação de Metro D. João II, no centro de Vila Nova de Gaia, e estacionamento gratuito no interior do Centro. Os percursos estão bem assinalados, com setas pretas em fundo amarelo. Quem vai do Porto tem setas logo que sai da Ponte do Infante. De segunda a quinta, a Bienal abre apenas à tarde (14:00 às 19:30) e, de sexta a domingo, das 11:00 às 20:00 horas.



Luiz Morgadinho, Ricardo Cardoso e Sérgio Reis


O Mestre (Zulmiro de Carvalho) e o antigo aluno da antiga ESBAP



Graça Morais autografando o catálogo da Bienal


domingo, 5 de março de 2017

“Grito para me fazer ouvir”

Vista parcial da exposição

 Artigo publicado no jornal Porta da Estrela nº 1050 de 22 fevereiro 2017

Encontra-se patente na Casa da Cultura de Seia até 26 de março 2017, uma importante exposição retrospetiva do artista senense Ricardo Cardoso, intitulada "Grito para me fazer ouvir".
A mostra permite acompanhar a evolução artística de Ricardo Cardoso desde o final da década de 1990, então com marcadas influências do mundo fantástico e surreal de H. R. Giger,  e a construção de uma obra surpreendente, marcada pela experimentação e por isso em continua metamorfose.
Ocupando todo o espaço da Casa da Cultura (salão, galerias e foyer do Cineteatro), a exposição reune dezenas de obras realizadas de 1999 a 2017, pintura a óleo sobre tela, desenho e pintura sobre papel, privilegiando os grandes formatos, e alguma escultura, para além da evocação de performances, condensadas na instalação que ocupa boa parte do salão. Esta instalação resulta da performance realizada na inauguração da mostra, no dia 4 de fevereiro, que deu o título à retrospetiva.
O artista iniciou a sua atividade performativa em 2005, tendo já realizado performances artísticas em diversas localidades, geralmente acompanhando as suas exposições. Nas palavras do próprio, a performance começou “por ser uma brincadeira, depois uma forma de entreter o observador” até adquirir muito sentido artístico e enorme importância no contexto global da sua obra, como espaço de criação em que o artista se envolve e expõe pessoalmente, manifestando ao vivo as suas ideias,  entendimentos e preocupações. Nem por acaso, a primeira série de performances surge numa fase muito interessante da obra do artista, caraterizada por um “trabalho mais inquieto e perturbador, onde o negro e as personagens expressivas predominam”, grandes desenhos negros onde o autor aprisionou alguns medos e desespero, oferecendo-os depois ao público como se fossem enormes espelhos de amargura.
Mas a maior e porventura melhor caraterística da obra de Ricardo Cardoso é a continuada aposta na experimentação, arriscando suportes estranhos (como a rede metálica em substituição da tela, por exemplo), interações de materiais em técnicas mistas nem sempre convencionais e combinando nas suas obras elementos orgânicos e geométricos, concretos e abstratos, realistas e surrealistas. Na opinião do artista, o objeto artístico é apenas “um resíduo da obra de arte” e a sua memória (como acontece na performance) o que originou produtos naturalmente muito diversos ao longo dos últimos 18 anos, mas a matriz da sua obra “é a mesma, onde prevalece a insatisfação, inquietude do ser e do presente, procurando sempre a experiência e outro futuro”.
 “Grito para me fazer ouvir” apresenta-se assim como uma espécie de manifesto artístico, revelando o modo como o artista se vê, o que o motiva, o papel social que pretende desempenhar, questionando interventivamente as verdades instituídas e participando na transformação dinâmica da sociedade com a sua participação crítica, estética e social. Para além da sua relevância nas artes plásticas, Ricardo Cardoso é um jovem empresário da área da conservação e restauro do Património e atual Presidente da Associação de Arte e Imagem de Seia.
Ricardo Cardoso nasceu em Seia em 1982. Licenciado em Artes / Desenho pela Escola Superior Artística do Porto  Guimarães e também formado em Conservação e Restauro de Madeiras – Arte Sacra pelo Cearte de Coimbra, expõe desde 2002, em vários pontos do país. Foi distinguido com Menções Honrosas no Agirarte (Oliveira do Hospital, 2010), no 7º Concurso de Arte Jovem (São Romão, 2002) e homenageado pelos artistas de Seia no âmbito da Artis IX (2010). Trabalha em São Romão, onde possui o seu atelier, no Bairro dos Moinhos, ocupando um pavilhão da antiga Fábrica Camello. Para além do espaço de trabalho, o atelier inclui uma galeria de arte, aberta a exposições de outros artistas.


Sérgio Reis

Ricardo Cardoso
 


Com Miró na Casa de Serralves



A Arte da Devoção - Ex-votos do concelho de Seia


Publicado no jornal Porta da Estrela nº 1046, 16 dezembro 2016

Encontra-se patente nas galerias da Casa da Cultura de Seia até 06 de janeiro 2017 uma interessante exposição de Ex-Votos, promovida pela Santa Casa da Misericórdia de Seia e organizada pela arqueóloga senense Rita Saraiva.

Intitulada “A Arte da Devoção”, a mostra apresenta uma grande variedade de Ex-Votos (tábuas votivas policromadas, objetos em cera e fotografia) recolhidos em várias igrejas e capelas do concelho, permitindo compreender o fenómeno do ex-voto nesta região no seguimento da sua difusão europeia a partir do século XVII, com maior expressão no século XVIII e XIX. Muitos santuários portugueses ostentam imponentes “salas dos milagres”, repletas de ex-votos, enquanto em algumas igrejas e capelas do Interior ainda há poucos anos continuavam esquecidos em armários ou a apodrecer em vãos de escada. Felizmente que a estima pela arte popular, compreensão da sua importância etnográfica e valorização como Património Cultural, permitiu salvar autênticas preciosidades – como as que podemos apreciar nesta surpreendente exposição.

O termo “ex-voto” deriva da expressão latina “ex-voto suscepto”, que significa “o voto realizado” por força de uma promessa. Exprime assim a religiosidade e devoção mas, ao representar o milagre ou a graça recebida (geralmente a salvação em situação de grande perigo, perda de bens, alívio ou cura de moléstias diversas), mobiliza os saberes e gostos dessa época, localidade, grupo social, e constitui um interessante objeto de estudo para antropólogos, arqueólogos, linguistas, historiadores de arte.

No que respeita à pintura, bem representada na exposição através de tábuas e telas votivas policromadas, com ou sem data, o que salta imediatamente à vista é a adorável ingenuidade das cenas pintadas com os únicos intuitos de agradar ao santo da devoção reconhecendo e publicitando o pedido atendido. Com mais ou menos desenho e pintura, com melhores ou piores tintas. Como escrevia Nicolau Tolentino ainda no séc. XVIII, “São más as tintas; mas é bom o intento”.

Uma boa parte dos ex-votos pintados são oriundos dos Santuários de Nossa Senhora do Desterro e de Santa Eufémia, enquadrando-se nos formatos mais usados em Portugal, de acordo com os estudos de Rocha Peixoto. As cenas pintadas são inspiradas pela pintura erudita, que os fiéis encontram nas igrejas e capelas para as evocações religiosas e catequese, assim como pela pintura das alminhas e “milagres”, com uma estrutura que seguia os modelos da época: o miraculado de um lado, frequentemente o doente acamado, e do outro a radiosa aparição do santo invocado. Em baixo, a legenda explica o ocorrido, identificando o santo, o miraculado e, às vezes, o suplicante.

O nível de representação, uso de tela e de boas tintas revela que estamos na presença de um artista profissional, existindo na exposição dois destes trabalhos, assinados e datados, realizados por Augusto C. R. F. da Costa (Gouveia, 1877) e F. J. Baptista, provavelmente de Viseu. Apenas as pessoas de maior posição social tinham possibilidade de encomendar ex-votos a pintores de maior nível enquanto as restantes recorriam a pintores amadores e aprendizes, que por vezes se encontravam a trabalhar nas pinturas de tetos e aparatos dos altares nas igrejas e capelas do século XVIII e XIX. A dificuldade em obter tintas, à época, assim o sugere, uma vez que a confeção das tintas exigia acesso a materiais por vezes inexistentes na região, alguns importados, assim como conhecimentos técnicos do processo de obtenção das tintas.
Sérgio Reis